Expectativa é reduzir custos ao excluir dólar em
operações, além de promover o comércio bilateral e facilitar investimentos
chineses por aqui
Acordos têm sido entendido como
uma boa notícia por especialistas consultados pela CNN, à medida que estreita
as relações Brasil-China e oferece uma alternativa à moeda norte-americana e
suas flutuaçõesPixabay
O presidente
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o mandatário
chinês Xi Jinping assinaram,
nesta sexta-feira (14/4), cerca de 20
acordos bilaterais visando fortalecer as relações
econômicas sino-brasileiras.
Dois deles estreitam o
relacionamento monetário entre os países, com a viabilização
de transações comerciais de câmbio direto entre o real brasileiro e renminbi
(RMB) — nome oficial da moeda chinesa, mais
conhecida no mundo ocidental como yuan. A expectativa é reduzir os custos
ao excluir o dólar da operação, além de promover o comércio bilateral e
facilitar investimentos por aqui.
O primeiro, antecipado no
último dia 29 de março, coloca o sino-brasileiro Bank of Communications BBM
(Bocom BBM) no CIPS (China Interbank Payment System), a alternativa chinesa
ao ocidental
Swift, que conecta milhares de instituições financeiras
em todo o mundo. Com isso, o Brasil será o primeiro país da América Latina a
ter acesso ao sistema chinês.
“Assinamos o acordo para ser
membro. O sistema vai estar plenamente operacional na segunda metade do ano.
Nossa meta é que seja algo ao redor de julho”, disse à Reuters Alexandre
Lowenkron, presidente-executivo do Bocom BBM.
O segundo, assinado via
Memorando de Entendimentos (MoU), institui a sucursal brasileira do Industrial
and Commercial Bank of China (ICBC) como um banco de compensação do RMB no país
— ou, nas palavras do Banco Popular da China, um “offshore clearing bank”.
Em nota à CNN, o
Banco Central do Brasil avalia que o acordo traz benefícios como o aumento da
liquidez da moeda chinesa no Brasil, a manutenção de reservas cambiais em moeda
forte no país, a redução de intermediários nos pagamentos internacionais e
aproximação do sistema de pagamentos local ao chinês.
A autoridade monetária
ressalta que “não se trata de um sistema de pagamentos de transações
comerciais, mas um instrumento que permite que as transações sejam feitas em
RMB e convertidas em reais de forma mais rápida e menos custosa.”
De acordo com um relatório
divulgado em novembro do ano passado pelo Banco do Povo da China (PBC, o banco
central chinês), já existem 27 “clearing houses” da moeda chinesa fora da China
em 25 países, como Canadá, Alemanha, França, Catar, Austrália e até os Estados
Unidos. A primeira delas foi iniciada em Hong Kong em 2003.
Na América do Sul, Chile e
Argentina já detêm esse tipo de laço com o gigante asiático.
‘Boa notícia’
Os acordos têm sido
entendidos como uma boa notícia por especialistas consultados pela CNN,
à medida que estreita as relações Brasil-China e oferece uma alternativa à
moeda norte-americana e suas flutuações.
“É uma notícia muito boa
para os dois países. Para o Brasil, é aquela velha história de não colocar
todos os ovos em uma cesta só”, afirma Isabela Nogueira, professora do
Instituto de Economia da UFRJ e coordenadora do LabChina (Laboratório de
Estudos em Economia Política da China), núcleo também vinculado à federal
fluminense.
“Isso é uma tentativa de
contornar o poder estrutural do dólar no sistema monetário internacional, que
dá aos Estados Unidos, na prática, o poder de interferir no raio de manobra dos
demais Estados ao explorar a dependência da moeda, ou eventualmente impor sanções”,
explica Nogueira.
Isso foi demonstrado,
segundo a especialista, na Guerra na
Ucrânia, com a apelidada “bomba-dólar”. Desde a invasão ao
território ucraniano, Estados ocidentais têm imposto sanções econômicas à
Rússia como forma de conter — ou
tentar — o conflito, e o bloqueio de US$ 300 bilhões do
total de US$ 640 bilhões de reservas internacionais russas veio para minar
alguns dos recursos financeiros do país.
“É uma arma muito efetiva,
disponível só para os Estados
Unidos, porque só eles têm um poder estrutural assim na
economia global. A moeda pode se converter em um instrumento de coerção. Nesse
sentido, a China está cavando uma pequena trincheira para conseguir fazer
frente ao dólar, pressionando países para a criação de clearing houses.”
“A China está cavando um
espacinho com a clearing house no Brasil. A retórica do governo chinês é de que
não se trata de um confronto com o dólar, mas um passo em direção ao mundo
plurimonetário que eles defendem. Nunca dizem que estão enfrentando o dólar,
porque, de fato, ainda não têm condições para isso”, afirma ele. “O dólar
é, de longe, a moeda mais importante do globo.”
A moeda norte-americana é
usada em 88% de todas as transações globais, de acordo com a última pesquisa
trienal do Bank for International Settlements (BIS), publicada em 2020. O yuan,
por outro lado, fica com 7%.
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