domingo, 14 de abril de 2024

O AUTOCONHECIMENTO

 

      

      Sócrates (470 a.C.-399 a.C.) 

          Por THEODIANO BASTOS

                         A vertigem da vida moderna e sua cultura dominada pelo hedonismo que faz do prazer a única razão de viver, tem seu preço na forma de angústia existencial. Lado a lado, valores divergentes a serem observados. Fica difícil a escolha do caminho a seguir, e o neurótico sofre bem mais por suas contradições interiores, seus conflitos não resolvidos.  Deve-se ter a vida analisada para se aprender a se defender de si próprio, pois o pior inimigo está dentro de nós.

                                   Mas como conhecer-se a si mesmo? Tem bem mais mulheres que homens crescendo de dentro para fora, procurando conhecer a face oculta da mente. É sabido que a fonte das neuroses e dos conflitos não resolvidos e recalcados estão no relacionamento familiar, até a adolescência, fase muito importante na formação humana, e  responsável pela ansiedade, depressão, indecisão, inércia, fadiga, alheamento, infelicidade, o medo difuso de perder o controle e explodir como um vulcão, fobias, complexos, doenças psicossomáticas, sofrimento.

                            Mestre, como o senhor resumiria toda sua filosofia, perguntam    angustiados os discípulos de Sócrates antes de sua morte? — "Conhece-te a ti mesmo", para conheceres os deuses e o universo, respondeu Sócrates. Cristo e Buda também pregavam a libertação pelo autoconhecimento. Escrito há 2.500 anos, hoje um livro estudado em universidades e multinacionais, no livro “A Arte da Guerra”, o filósofo e general chinês Sun Tzu, ensina: " Você começa a perder quando não vê no adversário qualidade. Está claro que quando existe uma competição, os dois competidores possuem qualidades e defeitos. O que tiver conhecimento deste conjunto será o vencedor. Se você conhece o inimigo e conhece a si mesmo, não precisa temer o resultado de cem batalhas. Se você se conhece e não conhece o inimigo, para cada vitória ganha sofrerá também uma derrota. Se você não conhece nem o inimigo e nem a si mesmo, perderá todas as batalhas. Riscos a serem evitados: Subestimar o próprio potencial e ficar na inércia ou superestimar esse potencial e cair na insensatez.

                      Mas é longo e tortuoso o caminho da libertação pelo autoconhecimento, a fim de coabitar pacificamente com os anjos e demônios interiores, mesmo com a ajuda de um psicanalista. Quando nascemos, já trazemos armazenados no cérebro algo como 30% da memória dos ancestrais, segundo estudos recentes; é o inconsciente coletivo de que fala Jung, de difícil acesso, e os 70% de memória, seja armazenado no consciente ou no inconsciente, são resultados de experiências desenvolvidas ao longo da vida graças ao aprendizado e dados através dos cinco sentidos conhecidos. É “o inconsciente pessoal”, segundo Jung. Isto é, já chegamos a este mundo com os conflitos básicos. Quando um homem e uma mulher se unem na formação de uma família, cada um já traz dentro de si suas neuroses, seus problemas, que influenciarão no relacionamento.

                      As forças subversivas da natureza humana, isto é, o ódio, a inveja e o ciúme, que dão forma a um outro eu, a sombra, o inimigo dentro de nós mesmos e que procura nos destruir. Forças compulsivas e inconscientes se digladiam internamente e tomam a forma demolidora que todos nós devemos temer. ”O inimigo mais perigoso que você poderá encontrar será sempre você mesmo”, advertia Friedrich Nietzche. Goethe, em Fausto, conta a luta interior de Guida: "No meu corpo há duas almas em competição, /anseia cada qual da outra se afastar./ Uma rude me arrasta aos prazeres da terra / e se apega a este mundo, anseios redobrados;/ outra ascende nos ares; nos espaços erra, aspira à vida terrena e a seus antepassados"

                      .       Quem sou eu? Quem é esse estranho que caminha ao meu lado?  É a nossa sombra, o lado negativo de nossa personalidade. Impotente em resolver os conflitos interiores, que nos causam tantos sofrimentos, temos a tentação de escolher como bode expiatório de nosso infortúnio quem esteja mais próximo, quem convive conosco, sejam os pais, irmãos, marido ou esposa. Como um espelho, vemos projetados nos pais nossos próprios defeitos que odiamos. "Toda criatura tem duas almas, uma que olha de dentro para fora, outra que olha de fora para dentro. O pai era o espelho que ensinava a se ver de fora para dentro". "Viver conscientemente conflitos, apesar de doloroso, pode ser um dom inestimável. Quando mais enfrentamos nossos conflitos e procuramos nossas próprias soluções, tanto mais ganharemos em liberdade e vigor interiores. Só quando estamos dispostos a arcar com os embates é que poderemos aproximar-nos do ideal de sermos o comandante de nossa própria nau", ensina a psicanalista Karen Horney na sua obra “Nossos Conflitos Interiores. E ser o “grande homem” de que fala a sabedoria chinesa, é ser aquele que domina seu próprio espírito. Também Erich Fromm ensina: "O objetivo da vida é nascer plenamente, mas a tragédia consiste em que a maior parte de nós morre sem ter nascido verdadeiramente. Viver é nascer a cada instante". E  novamente consola Goethe, em “Fausto”: "A quem persista na esperança, ainda resta a salvação”. Ângelo Silésius, um místico medieval, diz: "Se, no teu centro, um paraíso não puderes encontrar, não existe chance alguma de, algum dia, nele entrar".

                           

 

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