UM NOVO MUNDO É POSSÍVEL?
Theodiano Bastos
Tenho repetido nos
livros de minha autoria A Procura do Destino e O Triunfo das Idéias, em
artigos, e onde mais posso, as obras de Erich Fromm, principalmente "A
Revolução da Esperança" e "Ter ou Ser?", nelas encontramos
luzes: "Creio que nem o capitalismo ocidental nem o comunismo soviético
(que já faz parte do passado) — ou chinês, podem resolver o problema do futuro.
Ambos criam burocracias que transformam o homem numa coisa". “O homem deve
colocar as forças da natureza e da sociedade sob o seu controle consciente e
racional, mas não sob o controle de uma burocracia que administra coisas e
homem, mas sob o controle dos produtores livres e associados que administram
coisas e as subordinam ao homem, medida de todas as coisas”.
“O
homem pode destruir toda a vida civilizada e os valores que restarem e
construir uma organização bárbara, totalitária, que domine o que sobrar da
humanidade. Ter consciência desse perigo, analisar as expressões dúbias por
ambos os lados para impedir que os homens vejam o abismo para onde estão
marchando, é obrigação, o mandamento intelectual e moral que o homem deve
obedecer hoje. "Se não o fizer, seu fim será certo", alerta Erich
Fromm.
A
resposta para o problema da liberdade não será encontrada na mudança da forma
política de governo, mas na transformação econômica e social da sociedade.
Mudanças simultâneas na esfera da organização industrial e política da
estrutura do caráter e das atividades culturais. A concentração dos esforços em
qualquer uma dessas esferas com a exclusão ou negligência de qualquer das
outras, tem ação destrutiva sobre toda a modificação, continua ensinando Fromm,
que conclui: "Um passo de progresso integrado em todas as esferas da vida,
terá resultados de maior alcance e mais duradouros para o progresso da raça
humana, do que cem passos numa só direção". Hoje, com os recursos
disponíveis no Brasil na área de comunicação social de massa, e principalmente
a televisão e o rádio, como também jornais e revistas, com o que é possível
atingir até cidadãos analfabetos, hoje bem informados do que acontece no Brasil e no mundo, com seu
radinho a pilha, não é ser sonhador pensar que já se pode dar no Brasil um
passo decisivo para o fim da história "humanóide", na qual o homem
ainda não é completamente humano, mas ainda "O lobo do próprio
homem", na visão pessimista de Hobbes.
A
mídia vem sendo usado para tornar as criaturas infelizes com o que possuem,
impingindo uma sociedade de consumo com o uso da propagando subliminar, a
saturação psicológica inconsciente de nossas crianças. As empresas do futuro,
numa "nova síntese", ficarão com a iniciativa privada, mas de natureza
comunitária de fins comuns, que tenham de viver do lucro, porque sem lucro não
sobrevivem, mas cujo fim não seja o lucro em si, mas a prestação de serviços
públicos. O mundo se tornou uma imensa aldeia e a interdependência dos países é
de tal ordem, tão estreita, que quando se fala do destino do Brasil, também se
fala do destino de Gaia, a nave mãe Terra em viagem pelo espaço sideral, e
creio que o Brasil tem um grande destino a cumprir na história da humanidade,
na sobrevivência da espécie humana, com possibilidade de criar as condições que
apontem para um futuro de convivência mais fraterna. Todavia se observa e nos faz refletir, é a atual
ausência de reações por parte dos jovens diante do que se vê nesse descomunal
descalabro no Brasil dos nossos dias. Alienação, desesperança, egoísmo, dos
jovens? “Como explicar e compreender os
jovens brasileiros diante do descomunal descalabro que está marcando a
realidade brasileira. É voz corrente que jamais, em tempo algum da história
brasileira”?, pergunta a escritora Raquel Stivelman, em seu artigo Jovens:
ontem e hoje. (JB 08/4/06 p.All).
André
Malreaux diz: "A civilização atual está ocupada, provavelmente, em
inventar algo tão importante quanto o que o século XIX inventou. Mas não
sabemos exatamente o que é. É o ponto de passagem com as três hipóteses para o
futuro da humanidade: a) Uma grande tragédia; b) Um grande fenômeno espiritual
(não necessariamente religioso); c) Uma espécie de "terra de
ninguém", como a que já é habitada pelos especialistas". Almeja-se uma
globalização solidária: "Esse novo projeto crítico da sociedade não
pretenderia mais mudar o modo de produzir — do capitalismo para o socialismo —
mas procuraria universalizar direitos e bens dentro da sociedade de
mercado". Mesmo sem mudanças no modo de produzir, se está buscando um
aumento do bem-estar", disse ainda, citando Eric Hobsbawm, pensador
inglês, e Norberto Bobbio, filósofo italiano.
Enfim,
os humanos estão, hoje em dia, diante da escolha mais fundamental: não é a
escolha entre o capitalismo e o comunismo (já reprovado pela história), mas
entre o robotismo e o socialismo comunitário humanista, um socialismo com
liberdade, com produtores livres e associados, que administram coisas e as
subordinam ao homem, medida de todas as coisas, continua ensinando o mestre
Erich Fromm, que em suma diz que estamos a ponto de atingir um estado humano
correspondente à visão dos nossos grandes Mestres, tais como Lao-Tsé, Buda,
Cristo, Isaías, Sócrates e Maomé, pois todos ensinaram o uso da razão, do amor
e da justiça; no entanto, estamos diante do perigo da destruição da
civilização, ou da robotização, e dentre deste contexto é missão do Brasil
realizar essa "nova síntese". Se a Inglaterra e os Estados Unidos
moldaram a economia mundial, e a França, a partir de sua revolução de 1789, se
transformou em laboratório de experiências políticas, o Brasil moldará a
"nova síntese" no Século XXI. "Os grandes líderes da raça humana
são os que despertam o homem de seu meio-sono", diz Fromm.
Mas
com o advento da Internet – o mundo tornou-se uma grande aldeia, com os e-mails, Orkuts, Blogs, Chats, vlogs, os
chamados instant messengers (Ims)
etc, o ágora (da civilização
grega) é agora, porquanto permite, de forma global, uma propagação de idéias na busca de outro
mundo possível. “Todo grande país se faz pelas idéias, nunca pelos
acontecimentos, pois os acontecimentos têm sempre a dimensão das idéias que o
produzem... os fatos, sem as idéias, não criam realidades, mas sucessivas
ilusões, que trazem erros aos atos daí decorrentes.... A idéia é a verdadeira
orientadora da ação política, ensina Afonso Arinos de Melo Franco. Como Gabriel
Garcia Márquez, continuo obcecado pela fé na possibilidade de existirem outras
formas de se viver — mais justas, menos absurdas, mais dignas.
“Donde saiu este homem? Pergunta José Saramago: Não peço
que me digam onde nasceu, quem foram os seus pais, que estudos fez, que projeto
de vida desenhou para si e para a sua família. Tudo isso mais ou menos o
sabemos, tenho aí a sua autobiografia, livro sério e sincero, além de
inteligentemente escrito. Quando pergunto donde saiu Barack Obama estou a
manifestar a minha perplexidade por este tempo que vivemos, cínico,
desesperançado, sombrio, terrível em mil dos seus aspectos, ter gerado uma
pessoa (é um homem, podia ser uma mulher) que levanta a voz para falar de
valores, de responsabilidade pessoal e coletiva, de respeito pelo trabalho,
também pela memória daqueles que nos antecederam na vida”.
Estes
conceitos que alguma vez foram o cimento da melhor convivência humana sofreram
por muito tempo o desprezo dos poderosos, esses mesmos que, a partir de hoje
(tenham-no por certo), vão vestir à pressa o novo figurino e clamar em todos os
tons - “Eu também, eu também”. Barack Obama, no seu discurso, deu-nos razões
(as razões) para que não nos deixemos enganar. O mundo pode ser melhor do que
isto a que parecemos ter sido condenados. No fundo, o que Obama nos veio dizer
é que outro mundo é possível. Muitos de nós já o vínhamos dizendo há muito.
Talvez a ocasião seja boa para que tentemos pôr-nos de acordo sobre o modo e a
maneira. Para começar.
“Padrão
de consumo dos países desenvolvidos não pode ser replicado”
Para onde
irão os indignados e os “occupiers”?
Uma das mesas de debates importante no Fórum Social Temático, em Porto Alegre, da qual me coube participar, foi escutar os testemunhos vivos dos Indignados da Espanha, de Londres, do Egito e dos USA. O que me deixou muito impressionado foi a seriedade dos discursos, longe do viés anárquico dos anos 60 do século passado com suas muitas “parole”. O tema central era “democracia já”. Reivindicava-se uma outra democracia, bem diferente desta a que estamos acostumados, que é mais farsa do que realidade. Querem uma democracia que se constrói a partir da rua e das praças, o lugar do poder originário. Uma democracia que vem de baixo, articulada organicamente com o povo, transparente em seus procedimentos e não mais corroída pela corrupção. Esta democracia, de saída, se caracteriza por vincular justiça social com justiça ecológica.
Curiosamente, os indignados, os “occupiers” e os da Primavera Árabe não se remeteram ao clássico discurso das esquerdas, nem sequer aos sonhos das várias edições do Fórum Social Mundial. Encontramo-nos num outro tempo e surgiu uma nova sensibilidade. Postula-se outro modo de ser cidadão, incluindo poderosamente as mulheres, antes feitas invisíveis, cidadãos com direitos, com participação, com relações horizontais e transversais facilitadas pelas redes sociais, pelo celular, pelo twitter e pelos facebooks. Temos a ver com uma verdadeira revolução. Antes, as relações se organizavam de forma vertical, de cima para baixo. Agora é de forma horizontal, para os lados, na imediatez da comunicação à velocidade da luz. Este modo representa o tempo novo que estamos vivendo, da informação, da descoberta do valor da subjetividade, não aquela da modernidade, encapsulada em si mesma, mas da subjetividade relacional, da emergência de uma consciência de espécie que se descobre dentro da mesma e única Casa Comum; Casa em chamas, ou ruindo pela excessiva pilhagem praticada pelo nosso sistema de produção e consumo.
Essa sensibilidade não tolera mais os métodos do sistema de superar a crise econômica, e as crises dela derivadas, sanando os bancos com o dinheiro dos cidadãos, impondo severa austeridade fiscal, a desmontagem da seguridade social, o achatamento dos salários, o corte dos investimentos, no pressuposto ilusório de que desta forma se reconquista a confiança dos mercados e se reanima a economia. Tal concepção é feita dogma e aí se ouve o estúpido bordão: “TINA: there is no alternative”, não há alternativa. Os sacrílegos sumos sacerdotes da trindade nada santa do FMI, da União Européia e do Banco Central Europeu, deram um golpe financeiro na Grécia e na Itália e puseram lá seus acólitos como gestores da crise, sem passar pelo rito democrático. Tudo é visto e decidido pela ótica exclusiva do econômico, rebaixando o social e aumentando o sofrimento coletivo desnecessário, o desespero das famílias e a indignação dos jovens que não conseguem trabalho. Tudo pode desembocar numa crise com consequências dramáticas.
Paul Krugmann, prêmio Nobel de economia, passou uns dias na Islândia para estudar a forma como esse pequeno país ártico saiu de sua crise avassaladora. Lá seguiram o caminho correto que outros deveriam também ter seguido: deixaram os bancos quebrar, puseram na cadeia os banqueiros e especuladores que praticaram falcatruas, reescreveram a constituição, garantiram a seguridade social para evitar uma derrocada generalizada e conseguiram criar empregos. Consequência: o país saiu do atoleiro e é um dos que mais cresce nos países nórdicos. O caminho islandês foi silenciado pela mídia mundial, por temor de que servisse de exemplo para os demais países. E assim a carruagem, com medidas equivocadas mas coerentes com o sistema, corre célere rumo a um precipício.
Contra esse curso previsível se opõem os indignados. Querem um outro mundo, mais amigo da vida e respeitoso da natureza. Talvez a Islândia servirá de inspiração. Para onde irão? Quem sabe? Seguramente não na direção dos modelos do passado, já exauridos. Irão na direção daquilo que falava Paulo Freire “do inédito viável” que nascerá desse novo imaginário. Ele se expressa, sem violência, dentro de um espírito democrático-participativo, com muito diálogo e trocas enriquecedoras. De todas as formas, o mundo nunca será como antes, muito menos como os capitalistas gostariam que ficasse.
Uma das mesas de debates importante no Fórum Social Temático, em Porto Alegre, da qual me coube participar, foi escutar os testemunhos vivos dos Indignados da Espanha, de Londres, do Egito e dos USA. O que me deixou muito impressionado foi a seriedade dos discursos, longe do viés anárquico dos anos 60 do século passado com suas muitas “parole”. O tema central era “democracia já”. Reivindicava-se uma outra democracia, bem diferente desta a que estamos acostumados, que é mais farsa do que realidade. Querem uma democracia que se constrói a partir da rua e das praças, o lugar do poder originário. Uma democracia que vem de baixo, articulada organicamente com o povo, transparente em seus procedimentos e não mais corroída pela corrupção. Esta democracia, de saída, se caracteriza por vincular justiça social com justiça ecológica.
Curiosamente, os indignados, os “occupiers” e os da Primavera Árabe não se remeteram ao clássico discurso das esquerdas, nem sequer aos sonhos das várias edições do Fórum Social Mundial. Encontramo-nos num outro tempo e surgiu uma nova sensibilidade. Postula-se outro modo de ser cidadão, incluindo poderosamente as mulheres, antes feitas invisíveis, cidadãos com direitos, com participação, com relações horizontais e transversais facilitadas pelas redes sociais, pelo celular, pelo twitter e pelos facebooks. Temos a ver com uma verdadeira revolução. Antes, as relações se organizavam de forma vertical, de cima para baixo. Agora é de forma horizontal, para os lados, na imediatez da comunicação à velocidade da luz. Este modo representa o tempo novo que estamos vivendo, da informação, da descoberta do valor da subjetividade, não aquela da modernidade, encapsulada em si mesma, mas da subjetividade relacional, da emergência de uma consciência de espécie que se descobre dentro da mesma e única Casa Comum; Casa em chamas, ou ruindo pela excessiva pilhagem praticada pelo nosso sistema de produção e consumo.
Essa sensibilidade não tolera mais os métodos do sistema de superar a crise econômica, e as crises dela derivadas, sanando os bancos com o dinheiro dos cidadãos, impondo severa austeridade fiscal, a desmontagem da seguridade social, o achatamento dos salários, o corte dos investimentos, no pressuposto ilusório de que desta forma se reconquista a confiança dos mercados e se reanima a economia. Tal concepção é feita dogma e aí se ouve o estúpido bordão: “TINA: there is no alternative”, não há alternativa. Os sacrílegos sumos sacerdotes da trindade nada santa do FMI, da União Européia e do Banco Central Europeu, deram um golpe financeiro na Grécia e na Itália e puseram lá seus acólitos como gestores da crise, sem passar pelo rito democrático. Tudo é visto e decidido pela ótica exclusiva do econômico, rebaixando o social e aumentando o sofrimento coletivo desnecessário, o desespero das famílias e a indignação dos jovens que não conseguem trabalho. Tudo pode desembocar numa crise com consequências dramáticas.
Paul Krugmann, prêmio Nobel de economia, passou uns dias na Islândia para estudar a forma como esse pequeno país ártico saiu de sua crise avassaladora. Lá seguiram o caminho correto que outros deveriam também ter seguido: deixaram os bancos quebrar, puseram na cadeia os banqueiros e especuladores que praticaram falcatruas, reescreveram a constituição, garantiram a seguridade social para evitar uma derrocada generalizada e conseguiram criar empregos. Consequência: o país saiu do atoleiro e é um dos que mais cresce nos países nórdicos. O caminho islandês foi silenciado pela mídia mundial, por temor de que servisse de exemplo para os demais países. E assim a carruagem, com medidas equivocadas mas coerentes com o sistema, corre célere rumo a um precipício.
Contra esse curso previsível se opõem os indignados. Querem um outro mundo, mais amigo da vida e respeitoso da natureza. Talvez a Islândia servirá de inspiração. Para onde irão? Quem sabe? Seguramente não na direção dos modelos do passado, já exauridos. Irão na direção daquilo que falava Paulo Freire “do inédito viável” que nascerá desse novo imaginário. Ele se expressa, sem violência, dentro de um espírito democrático-participativo, com muito diálogo e trocas enriquecedoras. De todas as formas, o mundo nunca será como antes, muito menos como os capitalistas gostariam que ficasse.
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