Questões do império
Anacrônico e
antidemocrático, o
sistema eleitoral dos Estados Unidos e o mais complicado do mundo
UM GUIA PARA ENTENDER A ELEIÇÃO
AMERICANA
LUCAS DE ABREU MAIA
Você provavelmente já sabe
que as eleições americanas são, para usar um termo extremamente técnico, uma
bagunça. E bem difícil de entender para quem, como os brasileiros, raciocina
com base numa eleição direta, em que cada eleitor tem um voto, e o candidato
com mais votos vence.
O candidato democrata e
ex-vice de Barack Obama, Joseph Biden, é apontado pelas pesquisas como favorito
para derrotar o presidente Donald Trump. A apuração desta noite vai deixar
muita gente de unhas roídas. Ela acontece estado a estado, e não nacionalmente,
como no Brasil. Cada estado tem suas regras e um ritmo diferente para contar os
votos. A pandemia de Covid-19 aumenta ainda mais a incerteza. Dificilmente o
resultado oficial do pleito será conhecido até o fim do dia – mas já deveremos
ter sinais claros de quem será vencedor. A seguir, algumas perguntas para
ajudar a entender o sistema eleitoral americano e a forma como os votos são
distribuídos entre democratas (cujo símbolo é um burro) e republicanos (cujo
símbolo é um elefante).
Por que quem recebe mais votos da população nas eleições
americanas não necessariamente ganha a eleição?
Porque os EUA não foram
desenhados para ser uma democracia. Os autores da Constituição dos Estados
Unidos morriam de medo da “ditadura da maioria”. Acreditavam em uma República
governada por uma elite intelectual. Nesse sistema, o principal líder do país,
o presidente, não seria eleito pelo voto do povo.
A ideia era que o eleitor
de cada estado escolhesse alguns representantes para que comparecessem a uma
conferência nacional, chamada de colégio eleitoral. Nessa conferência, esses
representantes – os delegados – debateriam entre si e, juntos, escolheriam um
sujeito que se tornaria presidente.
Mal se passaram trinta anos
da promulgação da Constituição, em 1787, até que os delegados começassem a
vincular seus votos no colégio eleitoral a candidatos específicos. Ou seja, em
vez de dizerem que escolheriam o melhor homem (e, naquela época, era
necessariamente um homem) para governar o país depois de longos e complexos
debates, os delegados já se comprometiam de cara a votar num determinado
candidato.
Os estados aprovaram leis
obrigando todos os delegados daquele estado a votar no mesmo candidato – e esse
candidato tinha de ser, obrigatoriamente, o que recebeu a maioria dos votos dos
eleitores naquela unidade federativa.
Na década de 1830, já
estava em vigor o sistema atual, uma mistura de voto popular nos estados com o
colégio eleitoral que os autores da Constituição haviam pensado. Basicamente, o
sistema atual funciona assim: ocorre uma eleição em cada estado, em que os
eleitores votam nos seus candidatos favoritos para a Presidência. Mas, em vez
de somarem a votação de cada estado para encontrarem o vencedor em todo o país,
cada estado (e o Distrito de Columbia que, como o nosso Distrito Federal, não é
um estado formalmente) calcula seus votos separadamente. Cada uma dessas
unidades tem um número exato de delegados. No colégio eleitoral, esses
delegados têm, necessariamente, de votar no candidato que recebeu mais votos
naquele estado. É a soma dos votos de cada unidade federativa no colégio
eleitoral que determina o vencedor das eleições presidenciais americanas.
Há duas exceções à regra de
que o vencedor leva todos os delegados daquele estado: Maine e Nebraska. Neles,
a votação é conduzida distrito a distrito. Vai um delegado para o vencedor de
cada distrito e um, de bônus, para quem ganhou a eleição no estado inteiro. Há,
também, casos de delegados que, quando chegam ao colégio eleitoral, se recusam
a votar conforme o eleitorado do seu estado. Mas esses casos são raros o
bastante para nunca terem feito qualquer diferença numa eleição presidencial.
Como é definido o número de
delegados de cada estado?
Cada estado tem direito a
tantos delegados quantos assentos tem no Congresso americano, somando Câmara
dos Deputados e Senado. Por exemplo, a Califórnia tem 53 assentos na Câmara e
dois no Senado. Tem, portanto, 55 delegados no colégio eleitoral. A exceção é o
Distrito de Columbia, que não tem representação no Congresso mas tem três
delegados, mesmo assim.
Os assentos na Câmara são
distribuídos mais ou menos de acordo com a população de cada estado. Quanto
mais populoso o estado, maior sua delegação. Mas há limites. Nenhum estado pode
ter menos que um deputado, e o número máximo de deputados na Câmara é 435. O
número de assentos no Senado não é proporcional à população. Cada um dos 50
estados tem dois senadores. Isso cria uma distorção, porque os estados mais
populosos têm, no Senado, o mesmo número de representantes dos estados menos
populosos – e isso vai se refletir na relação entre o total de eleitores
representados por delegado no colégio eleitoral.
O colégio eleitoral tem 538
delegados, e vence quem tiver maioria absoluta, com pelo menos 270 votos. https://piaui.folha.uol.com.br/um-guia-para-entender-eleicao-americana/
Por isso Jorge
Pontual diz: ‘É muito arcaico e até antidemocrático esse sistema americano’
O GLOBO
05/11/20
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