quinta-feira, 5 de novembro de 2020

A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL ESTÁ DESTRUINDO A INTELIGÊNCIA HUMANA

Valdir de Oliveira: “A inteligência artificial está destruindo a inteligência humana e precisamos refletir sobre isso”

Entrevista // Valdir Oliveira, superintendente do Sebrae-DF

O Sebrae-DF vai promover o Inova Digital, evento entre 12 e 14 de novembro, com a presença de celebridades do mundo digital como a consultora Brittany Kaiser, diretora de desenvolvimento da Cambridge Analytica, empresa que combinava mineração a análise de dados com comunicação estratégica para processos eleitorais.

Kaiser participou do documentário Privacidade hackeada, transmitido pela Netflix.

Outra figura que confirmou presença é Jaron Lanier, um dos maiores conhecedores da realidade virtual no mundo.

Crítico do Facebook e do Google, é considerado pela revista Time uma das 100 pessoas mais influentes do mundo.

Jaron participou do documentário O Dilema das Redes, na Netflix.

O superintendente regional do Sebrae, Valdir Oliveira, tem se interessado bastante pelo assunto e acredita que há lições para o setor produtivo.

O que Brittany Kaiser, contratada como diretora de negócios da Cambridge Analytica, pode ajudar na compreensão do mundo hoje?

Na transformação, no efeito da manipulação na vida das pessoas. Essa atuação da Cambridge Analytica transformou as pessoas em produto. Ela trouxe um novo conceito de marketing, onde o objetivo é a mudança no comportamento das pessoas para que elas possam consumir o que se está vendendo, independente de ser útil ou não, de ser bom ou não, da necessidade ou não. Precisamos fazer uma reflexão dos limites éticos dessa manipulação das pessoas.

Estamos orientando nossos empreendedores a fazerem a sua transformação digital. Precisamos também estimula-los a uma reflexão dos limites éticos que eles precisam observar para que não criemos monstros com inteligência artificial que nos transformem em robôs a serviço deles.

Não podemos permitir que a inteligência artificial se sobreponha à inteligência humana. Não podemos permitir que a humanidade se destrua pela ignorância e fique a serviço de interesses pontuais.

A Brittany Kaiser se tornou uma ativista na defesa da privacidade das pessoas, na proteção de seus dados, porque ela sabe as terríveis consequências da sua atuação na Cambridge Analytica, que transformou o sentimento das pessoas em ódio e destruição.

A Brittany Kaiser se transformou na resistência à manipulação devido à consciência de seus próprios erros e à ação das autoridades contra o crime cometido.

 

Você tem se interessado muito pelo tema. O que o impressiona na manipulação de dados e invasão da privacidade?

No que nos transformam, no que nos tornamos após sermos manipulados. Na capacidade da inteligência artificial de definir a nossa própria vida, nossos desejos e nossa tomada de decisão.

A atuação com Big Data tem o poder de tirar as pessoas da zona de conforto, da letargia frente à insatisfação e transformá-las em um exército que não sabe ao certo os motivos da guerra, mas que está disposto a vencê-la a qualquer custo.

A inteligência artificial está destruindo a inteligência humana e precisamos refletir sobre isso.

Os instrumentos utilizados nessa manipulação são perversos porque usam do seu próprio perfil para mudar o seu comportamento, sem que você perceba. E quando menos se espera, você está a serviço de uma guerra onde o seu objetivo principal pode ser destruir a si.

O maior ativo da humanidade é a sua liberdade. E o trabalho do Big Data com inteligência artificial retira sua liberdade de escolha e lhe põe a serviço de outros.

A manipulação e a invasão da privacidade são uma afronta à liberdade individual, que é uma cláusula pétrea da vida das pessoas. Precisamos dar um basta nisso para salvarmos o futuro das próximas gerações.

Qual é o maior perigo da manipulação de dados da internet na política e no mercado?

Escolhermos o que não queremos, a decisão de consumo diferente da sua real necessidade, do seu desejo.

Quando somos alvo de manipulação, mudamos nosso comportamento e somos induzidos a termos o desejo que interessa a quem nos manipula e não do que de fato queremos ou precisamos.

Isso serve para o mercado e serve para a política. Até que ponto é ético influenciar na sua decisão de consumo, seja no mercado ou na política, para o único propósito de interesses que não são seus?

Até que ponto é ético despertar o medo para ter como resposta a decisão de consumo que interessa ao manipulador e não aos seus desejos?

Até que ponto é ético invadir a sua privacidade sem o seu consentimento para lhe usar para o propósito do manipulador? O maior perigo da manipulação é lhe transformar em robô na defesa do interesse alheio.

O perigo que corremos é a criação de uma sociedade desprovida de vontade própria, que não defenderá mais suas próprias ideias, um exército de robotizáveis a serviço do interesse de poucos.

Aqui no Brasil, desde nossa descoberta, lutamos por independência. Entretanto, se permitirmos o trabalho do Big Data e da inteligência artificial sem freios e contrapesos, nos tornaremos novamente colônia de um império que servirá ao enriquecimento de poucos. https://blogs.correiobraziliense.com.br/cbpoder/valdir-de-oliveira-a-inteligencia-artificial-esta-destruindo-a-inteligencia-humana-e-precisamos-refletir-sobre-isso/

EUA: SISTEMA ELEITORAL MAIS COMPLICADO DO MUNDO

Questões do império

Anacrônico e antidemocrático, o sistema eleitoral dos Estados Unidos e o mais complicado do mundo

UM GUIA PARA ENTENDER A ELEIÇÃO AMERICANA

LUCAS DE ABREU MAIA

Você provavelmente já sabe que as eleições americanas são, para usar um termo extremamente técnico, uma bagunça. E bem difícil de entender para quem, como os brasileiros, raciocina com base numa eleição direta, em que cada eleitor tem um voto, e o candidato com mais votos vence.

O candidato democrata e ex-vice de Barack Obama, Joseph Biden, é apontado pelas pesquisas como favorito para derrotar o presidente Donald Trump. A apuração desta noite vai deixar muita gente de unhas roídas. Ela acontece estado a estado, e não nacionalmente, como no Brasil. Cada estado tem suas regras e um ritmo diferente para contar os votos. A pandemia de Covid-19 aumenta ainda mais a incerteza. Dificilmente o resultado oficial do pleito será conhecido até o fim do dia – mas já deveremos ter sinais claros de quem será vencedor. A seguir, algumas perguntas para ajudar a entender o sistema eleitoral americano e a forma como os votos são distribuídos entre democratas (cujo símbolo é um burro) e republicanos (cujo símbolo é um elefante).  

Por que quem recebe mais votos da população nas eleições americanas não necessariamente ganha a eleição?

Porque os EUA não foram desenhados para ser uma democracia. Os autores da Constituição dos Estados Unidos morriam de medo da “ditadura da maioria”. Acreditavam em uma República governada por uma elite intelectual. Nesse sistema, o principal líder do país, o presidente, não seria eleito pelo voto do povo.

A ideia era que o eleitor de cada estado escolhesse alguns representantes para que comparecessem a uma conferência nacional, chamada de colégio eleitoral. Nessa conferência, esses representantes – os delegados – debateriam entre si e, juntos, escolheriam um sujeito que se tornaria presidente.

Mal se passaram trinta anos da promulgação da Constituição, em 1787, até que os delegados começassem a vincular seus votos no colégio eleitoral a candidatos específicos. Ou seja, em vez de dizerem que escolheriam o melhor homem (e, naquela época, era necessariamente um homem) para governar o país depois de longos e complexos debates, os delegados já se comprometiam de cara a votar num determinado candidato.

Os estados aprovaram leis obrigando todos os delegados daquele estado a votar no mesmo candidato – e esse candidato tinha de ser, obrigatoriamente, o que recebeu a maioria dos votos dos eleitores naquela unidade federativa.

Na década de 1830, já estava em vigor o sistema atual, uma mistura de voto popular nos estados com o colégio eleitoral que os autores da Constituição haviam pensado. Basicamente, o sistema atual funciona assim: ocorre uma eleição em cada estado, em que os eleitores votam nos seus candidatos favoritos para a Presidência. Mas, em vez de somarem a votação de cada estado para encontrarem o vencedor em todo o país, cada estado (e o Distrito de Columbia que, como o nosso Distrito Federal, não é um estado formalmente) calcula seus votos separadamente. Cada uma dessas unidades tem um número exato de delegados. No colégio eleitoral, esses delegados têm, necessariamente, de votar no candidato que recebeu mais votos naquele estado. É a soma dos votos de cada unidade federativa no colégio eleitoral que determina o vencedor das eleições presidenciais americanas.

Há duas exceções à regra de que o vencedor leva todos os delegados daquele estado: Maine e Nebraska. Neles, a votação é conduzida distrito a distrito. Vai um delegado para o vencedor de cada distrito e um, de bônus, para quem ganhou a eleição no estado inteiro. Há, também, casos de delegados que, quando chegam ao colégio eleitoral, se recusam a votar conforme o eleitorado do seu estado. Mas esses casos são raros o bastante para nunca terem feito qualquer diferença numa eleição presidencial.

Como é definido o número de delegados de cada estado?

Cada estado tem direito a tantos delegados quantos assentos tem no Congresso americano, somando Câmara dos Deputados e Senado. Por exemplo, a Califórnia tem 53 assentos na Câmara e dois no Senado. Tem, portanto, 55 delegados no colégio eleitoral. A exceção é o Distrito de Columbia, que não tem representação no Congresso mas tem três delegados, mesmo assim.

Os assentos na Câmara são distribuídos mais ou menos de acordo com a população de cada estado. Quanto mais populoso o estado, maior sua delegação. Mas há limites. Nenhum estado pode ter menos que um deputado, e o número máximo de deputados na Câmara é 435. O número de assentos no Senado não é proporcional à população. Cada um dos 50 estados tem dois senadores. Isso cria uma distorção, porque os estados mais populosos têm, no Senado, o mesmo número de representantes dos estados menos populosos – e isso vai se refletir na relação entre o total de eleitores representados por delegado no colégio eleitoral.

O colégio eleitoral tem 538 delegados, e vence quem tiver maioria absoluta, com pelo menos 270 votos. https://piaui.folha.uol.com.br/um-guia-para-entender-eleicao-americana/

Por isso Jorge Pontual diz: ‘É muito arcaico e até antidemocrático esse sistema americano’                             O GLOBO 05/11/20